quinta-feira, 26 de agosto de 2021

Netflix: RUA DO MEDO: 1666 - PARTE 3 (2021, de Leigh Janiak)


O fato de a trama do terceiro capítulo desta trilogia de terror adolescente desenvolver-se no século XVII faz com que os dois principais problemas dos filmes sejam diluídos: ao invés da saraivada de canções, temos agora uma maior participação da trilha musical de Marco Beltrami, Anna Drubich e Marcus Trumpp, composta por eficientes temas lúgubres; e, como trata-se de uma circunstância passada numa colônia de pioneiros norte-americanos, não há o determinismo chavonado que opõe uma cidade promissora a outra fadada às tragédias. O maior defeito passa a ser rítmico: no afã por denunciar a hipocrisia religiosa e erigir um panfleto 'pop' em defesa da homossexualidade juvenil, a diretora exagera nos cortes, na falta de lógica típica dos clichês de gênero. Até que as situações em aberto do primeiro filme são reconvocadas - e tudo degringola de vez: o resultado é péssimo!


Por mais que a protagonista Kiana Madeira esforce-se para transmitir credibilidade em sua saga histórica de redenção, as estratégias adotadas pelo roteiro para criminalizar os culpados são as piores possíveis: todas as gerações de uma família são condenadas a repetir uma tradição de malevolência contumaz e de invocações satânicas. A antítese óbvia é disparada, num chistoso trocadilho anglofílico: 'Goode is evil'! Ao menos, a evocação fonética do medo no sobrenome da personagem enforcada como bruxa ('Fier') mantém-se conservada, a despeito das más escolhas produtivas: quando "Come Out and Play", da banda The Offspring, é executada, o filme recusa qualquer infinitésimo de seriedade roteirística aplicado até então. É difícil suportar a sessão até o final, de tão esquizofrênico e sub-piadista que o filme se torna!


Na seqüência dos créditos finais, o mais reles dos cacoetes das estórias de terror é aplicado: as personagens esquecem o livro de feitiços no chão e alguém põe as mãos sobre ele, reiniciando fora do quadro o ciclo de feitiços e assassinatos que ocorre há mais de trezentos anos. Se a primeira metade deste filme possui alguns breves momentos de interesse denuncista, estes são malogrados pelo justiçamento 'nerd' da segunda metade. Por mais que torçamos pelo beijo lésbico no desfecho - ao som de "Gigantic", de Pixies - este filme comprova o quão desengonçado (e até mesmo perigoso) é o entulhamento de referências usurpadas pelo padrão netflíxico de narrativa esvaziada. Culpa da série literária de R. L. Stine, talvez? Não necessariamente. As más intenções dos enredos algorítmicos da contemporaneidade atingem aqui um desonroso - e mercadologicamente bem-sucedido - nadir! 


Wesley Pereira de Castro. 

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