quarta-feira, 20 de outubro de 2021

Mostra SP 2021: ATLÂNTIDA (2021, de Yuri Ancarani)


O realizador deste filme possui vasto currículo como videoartista, o que explica o cariz fascinante das suas imagens, acompanhadas de uma trilha musical eletrônica e inebriante. Às vezes, tem-se a impressão de que estamos diante de uma videoinstalação projetada numa 'rave' lacustre, com variegados momentos de celebração canabídica. O protagonista Daniele, numa irrupção telejornalística, é anunciado como morto. Estamos assistindo a uma ficção ou a um documentário? Como saber? Para que saber? O filme é sobre curtir o momento...


Nos derradeiros minutos, o título mítico deste longa-metragem assume um aspecto evocador, de modo que a câmera é propositalmente enviesada, criando imagens especulares que parecem estar conduzindo o espectador a um ambiente submarino, num percurso psicodélico. É a maneira ideal de prestar reverência 'post-mortem' ao personagem principal, um jovem marginal (em todos os sentidos do termo) que impregna a tela com seu chamariz erótico suprimido pela falta de perspectivas. Ele dorme num barco, rouba hélices de lanchas estacionadas na vizinhança e ignora os desejos sexuais de sua primeira namorada. Mas navega sempre que pode. E vende tabletes de maconha aos adolescentes festivos que passeiam pelas águas de Veneza.


Quando acostumamo-nos à percussividade somática do filme, à sua musicalidade intrínseca, o itinerário é delicioso. Mas, ao esperarmos maior definição acerca da personalidade de Daniele, decepcionamo-nos: ele permanecerá misterioso, vagando perenemente. O diretor é também responsável pela fotografia, pela montagem e por muitos outros aspectos desta obra. A trilha musical é um deleite. Mas, quando passa o efeito do delírio, pouco resta: é um filme que dedica-se persistentemente à reprodução de experiências sensórias, quase como as atrações imersivas dos parques cibernéticos. Possui os seus méritos fungíveis, portanto! 



Wesley Pereira de Castro. 

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