quinta-feira, 14 de outubro de 2021

Mostra SP 2021: OS INVENTADOS (2021, de Leo Basilico, Nicolás Linginotti & Pablo Rodríguez Pandolfi)


A idéia é muito boa: um retiro/oficina de interpretação, no qual os inscritos ficam tão imersos nos personagens que inventam para si mesmos que chegam a esquecer de quem são e ignoram quem desaparece ao redor. É uma sinopse que pode desencadear excelentes reflexões sobre o processo artístico e trazer embutidas algumas análises psicológicas sobre o que ocorre com os participantes de 'reality shows'. Entretanto, os três diretores preferem flertar com as convenções do suspense dramático e, ao optarem por este caminho, desperdiçam o potencial do roteiro, enquanto indutor de autodescobertas... 


Logo no começo, o idealizador deste retiro cita uma série de teorias teatrais, nas quais a busca pela entrega interpretativa completa é acompanhada de questionamentos sobre a própria realidade. "Há um telefone fixo na casa, para o caso de algum de vocês ter um ataque de esquizofrenia", complementa. Ao parecer o mais sóbrio dentre o quinteto de confinados, é justamente o protagonista quem parece esquizofrênico. E isso se deve muito à composição "privilegiada" de seu personagem, no sentido de que ele é o único que possui um passado compartilhado com os espectadores: imbuído das características chavonadas de um fracassado, ele é um ex-ator infantil que, após uma briga familiar, trabalha como atendente de telemarketing. É o clichê do solitário, do babaca carinhoso porém atrapalhado. E seu tratamento é visivelmente assimétrico em relação aos demais!


Interpretado por Juan Grandinetti, este personagem finge que é um dermatologista, de nome Matías, e compartilha morada com quatro pessoas que obedecem ao mais óbvio dos esquemas narrativos: alguém sobremaneira discreto, que é o primeiro a desaparecer; um rapaz excessivamente espirituoso porém inconveniente; uma mulher bem intencionada e tendente às bebedeiras; e a jovem mui simpática (vivida por Verónica Gerez) por quem ele está apaixonado antes mesmo de matricular-se nesta oficina de atuação. Segue-se uma cadeia de eventos previsíveis, até que algo não necessariamente surpreendente, mas positivo, acontece antes do desfecho. No letreiro final, o corolário: "não é casual que os agradecimentos ocupem a maior parte dos créditos. Muito obrigado à universidade pública, que nos uniu e demonstrou que tudo isso era possível". Que bom que, havendo o estímulo adequado - e os financiamentos decorrentes -, projetos acadêmicos como este ainda possam ser executados com confiança e zelo!


Wesley Pereira de Castro.

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