quarta-feira, 2 de novembro de 2022

Mostra SP 2022: AGITAÇÃO (2022, de Cyril Schäublin)


No início do filme, algumas raparigas aristocratas conversam sobre as intenções do primo de uma delas, Pyotr Kropotkin (Alexei Evstratov), que pretende migrar da Rússia para uma zona fabril numa cidade montanhosa do interior suíço. De repente, elas começam a enumerar as principais diferenças entre o socialismo e o anarquismo, cogitando a importância da lógica territorial neste último sistema de governo, baseado na autogestão. É quando somos apresentados ao próprio Kropotkin, que alega estar desenhando um mapa cartográfico, envolvendo-se com os trabalhadores de uma fábrica de relógios...


De maneira regida por um tempo mui particular, em que vários personagens são apresentados simultaneamente, afeiçoamo-nos a algumas funcionárias da fábrica, com destaque para Josephine (Clara Gostynski), que nutre uma simpatia declarada pelas idéias anarquistas. Nalgum momento, ela apaixonar-se-á por Pyotr e lhe explicará como funciona o seu trabalho, sendo ela responsável pela inserção das rodas de agitação nos relógios, que produzem o tique-taque característico desses produtos. Pouco a pouco, esse tique-taque invadirá a própria banda sonora do filme, que erige várias simetrias paralelas, através de situações que se repetem e de enquadramentos que focalizam muitas pessoas em diferentes atividades, ao mesmo tempo. 


Em momentos pontuais, o roteiro permite a constatação de um humor melancólico, como quando uma mulher reclama da vacuidade de ter ganho um relógio-despertador num sorteio, visto que ela acorda todos os dias no mesmo horário, mesmo quando está em folga. Há inúmeras seqüências de pessoas ajustando os ponteiros dos relógios locais, o que é reforçado pela peculiar circunstância daquela cidade, que possui quatro fusos horários internamente regulamentados. O diretor da fábrica (Valentin Merz) insiste para que a medida temporal utilizada m seu estabelecimento imponha-se sobre os demais. Entremeando estas situações, as contínuas tentativas de mensuração de ações humanas corriqueiras, como caminhar por uma alameda ou produzir um determinado objeto. De um instante para o outro, as fotografias dos personagens supracitados têm seus preços aumentados, quando o vendedor percebe o interesse de potenciais compradoras. Tudo é regido pelo Capitalismo, portanto - e o filme critica isso de uma maneira tão charmosa quanto inteligente!


Wesley Pereira de Castro. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário