terça-feira, 22 de outubro de 2024

Mostra SP 2024: DON GOYO (2023, de Jorge Flores Velasco)


Apesar de ser o personagem-título deste filme e da novela homônima - publicada em 1933, por Demetrio Aguillera Malta [1909-1981] -, Don Goyo (Carlos Chiriboga) aparece pouco. Ele é sobremaneira mencionado - e inicialmente temido -, mas a verdadeira protagonista do filme é Cusumbo (Jenifer Carabalí), uma cortadora de cana-de-açúcar que, após a constatação de diversas injustiças, migra para Guayaquil, onde espera experimentar não apenas a própria liberdade como incitar o sentimento de libertação entre aqueles que, como ela, vêm sendo explorados há gerações... 


Permeado pelo realismo fantástico, este drama equatoriano tem aparência épica, mas a sua realização é contrastante: seja por conta da curta duração (pouco mais de uma hora e dez minutos), seja pela utilização excessiva de telas pretas, em seqüências narrativamente impactantes ou para demarcar a passagem de tempo entre as situações. Estes dois aspectos diluem a força da trama, que possui uma contradição elementar na composição da protagonista, atravessada pelas anuências do machismo estrutural. Afinal, ela opta por ficar ao lado de seu pai, depois que este espanca a sua mãe até a morte, durante uma reação colérica atiçada pelo alcoolismo, ou quando, ao flagrar seu amante e sua patroa em conluio sexual, ela sente mais raiva dela que dele, assassinando a ambos. 


A abertura do filme é promissora, ao fazer com que o mito de Don Goyo, um negro ancestral que é "pai dos nascidos no mangue", seja contada por um "coronel" local, que, obviamente, descreve a entidade decolonial como alguém possuído pelo Diabo, como um fantasma temível. É quando somos apresentados à jovem Cusumbo, que, alegando não saber dançar, apaixona-se pelo impetuoso Nico (Enrique Guzmán), que deseja fazer sexo com ela "da mesma maneira que as vacas se entregam para os bois". A moça consente, e esta submissão inicial é problematizada no desfecho, depois do encontro com Don Goyo, ainda que o roteiro, escrito pelo próprio diretor, não disponha de suficiente tempo para tornar a personagem tão memorável quanto ela poderia ser, enquanto esboço reivindicativo do proletariado e/ou liderança feminista. Seja como for, trata-se de uma obra bem fotografada, que utiliza as imagens florestais de maneira imponente. O que atrapalha é a montagem apressada. Mas vale a pena buscarmos o livro original, que tal?



Wesley Pereira de Castro. 

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