segunda-feira, 11 de outubro de 2021

Olhar de Cinema: A GUERRA DE MICHAEL (2020, de Gregório Gananian & Daniel Tagliari)


Se alguém quiser encontrar um argumento para atacar este inventivo curta-metragem, a impressão de que trata-se de uma continuidade publicitária audiovisual para o disco "Desejo de Lacrar", lançado em 2020 por Negro Léo, surge imediatamente. Porém, esse também é um dos grandes méritos do filme, que demonstra ter compreendido muitíssimo bem os pensamentos vanguardistas do músico em pauta, um dos grandes filósofos/estetas da contemporaneidade: servindo-se de uma montagem que emula os 'ciné-tracts' sessentistas, há muita inspiração de Jean-Luc Godard e Glauber Rocha nesta explosão de imagens, sons e sobreposições. Não por acaso, o músico maranhense - cujo trabalho "não é subordinado ao estatuto-canção, mas ao estatuto vocal" - já foi objeto de um ótimo longa-metragem dirigido por sua sogra, Paula Gaitán...


Despejando a sua genialidade como se disparasse um fuzil, Negro Léo insiste que "a arte não traz a solução" e posiciona-se contra "a confusão mental das 'hashtags'". No curta-metragem, o álbum original - que já é um amálgama de fragmentos - é apresentado ainda mais fragmentado, quase reduzido a átomos mui explosivos de uma guerra cultural em curso, em que o ato de "lacrar é o reconhecimento da impossibilidade de justiça". Resta a tentativa enquanto expressão, o desejo e a paixão de fazer o que se acredita. Tudo isso abunda no documentário: quase dezessete minutos de uma ejaculação incontrolável de idéias e experimentalismos, que corroboram o caráter testamental, em vida, do grande pensador Leonardo Gonçalves Campêlo. Viva Negro Léo!


Filme permeado por um extremo sentimento de juventude, de brados militantes que não envelhecem, ele periga ser bastante incompreendido e/ou hostilizado. Foi criado num tempo à parte, e excita os espectadores a conhecerem melhor o artista aqui homenageado, que eventualmente ensaia alguns passos de dança consagrados por Michael Jackson [1958-2209], num vídeo de bastidores. Seria essa a explicação do título? Sigamos refletindo - e agindo. Eis o que o filme grita!


Wesley Pereira de Castro. 

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