quinta-feira, 18 de abril de 2013

OBLIVION ('Oblivion'). EUA, 2013. Direção: Joseph Kosinski.

Apesar de não ser uma regravação, à medida que este filme avança, é possível detectar o afã do diretor Joseph Kosinski em homenagear os clássicos da ficção científica que aprecia: as impressionantes imagens do planeta Terra devastado – podendo-se encontrar em meio a regiões desérticas ruínas de monumentos famosos, inclusive a mítica tocha da Estátua da Liberdade – remetem a “O Planeta dos Macacos” (1968, de Franklin J. Schaffner); a trama sobre memórias apagadas e implantadas emula aspectos do roteiro de “O Vingador do Futuro” (1990, de Paul Verhoeven); e as armas maquínicas que podem ser reprogramadas quando defeituosas fazem pensar em “Hardware - O Destruidor do Futuro” (1990, de Richard Stanley). Além destas referências reconhecíveis, o pretensioso diretor pretende efetivar um decalque do personagem robótico HAL-9000 através da comandante holográfica Sally (Melissa Leo), mas seus méritos soçobram consideravelmente, para além de qualquer comparação indébita com “2001: Uma Odisséia no Futuro” (1968, de Stanley Kubrick), constantemente citado nas entrevistas e/ou resenhas sobre o filme, visto que “Oblivion” está muitíssimo aquém de qualquer uma das obras citadas em sua exposição ingênua e deslumbrada de um mundo devastado pelos interesses gananciosos de exploradores dos recursos naturais terrestres.

 Ao roteirizar, ao lado de Karl Gajudsek e Michael Arndt, uma extensão tramática da história em quadrinhos que ele mesmo escrevera há alguns anos, em parceria com Arvid Nelson, Joseph Kosinski, neste segundo longa-metragem como diretor [o primeiro fora “Tron: O Legado” (2010), ainda não visto] dilui previamente o impacto de qualquer potencial denúncia política contida no enredo por causa de suas intervenções românticas inconvenientemente xaroposas, como, por exemplo, as rememorações pré-matrimoniais que perseguem o protagonista Jack Harper (Tom Cruise) desde a primeira cena do filme. O sobejo de pudicícia nas cenas de conjunção carnal entre Jack e as mulheres com quem se relaciona deixa claro o direcionamento pueril da narrativa, propositalmente confusa e obtusamente bifurcada na segunda metade, quando a aparição da personagem Julia Rusakova (vivida pela da apática Olga Kurylenko) dilui a seriedade que parecia bem desenvolvida na justificativa histórica para a destruição da Lua e os conseqüentes efeitos catastróficos na Terra.

A submissão exacerbada de Jack à sua função mecânica no planeta evacuado deixa de ser um componente sustentacular de sua construção enquanto personagem dotado de memórias persistentes para converter-se num motriz enredístico sem vigor e eticamente desperdiçado na seqüência final, quando um de seus clones reencontra a esposa soviética e sua filhinha de três anos (concebida por outro clone de Jack, na verdade), enquanto a narração atualiza os detalhes volitivos pretensamente humanísticos que foram ouvidos na abertura do filme.

 Não obstante a direção infantilizada e pudica (no pior sentido de ambos os termos) e o roteiro insosso, as atuações e a trilha sonora também são deveras prejudiciais na apreciação geral do filme. Em relação ao segundo quesito, pode-se alegar que as intervenções musicais do grupo eletrônico francês M83 talvez funcionem isoladamente, mas, enquanto acompanhamento para as seqüências românticas e/ou de ação, elas incomodam por causa da obviedade desvirtuadora. A canção-título, interpretada por Susanne Sundfør durante os créditos finais, é graciosa, mas também não se coaduna positivamente ao filme, em sua exortação passional àquilo que é recorrentemente visto nos sonhos.

Já no que diz respeito ao elenco, composto por atores competentes, os desempenhos são predominantemente rasos: Tom Cruise está impregnado de vaidade desde que surge, chegando ao cúmulo da jactância no instante em que reconstitui vocalmente uma partida decisiva e surpreendente de futebol americano nos escombros de um estádio destruído, mas demonstra firmeza nos momentos de ação; Morgan Freeman pouco pode fazer com um personagem que tinha tudo para ser complexo mas é reduzido a um ex-antagonista sábio e um tanto bonachão; a já citada Olga Kurylenko é bonita, mas exala marasmo; Andrea Riseborough compõe com cautela as sutilezas personalísticas da esposa tecnocrática que interpreta, mas é injustamente relegada a uma função involuntariamente acessória da conscientização do protagonista; e o secundário Nikolaj Coster-Waldau conforma-se à desconfiança estereotípica do saqueador que vivifica. No filme, infelizmente, quem manda mesmo são as máquinas! 

 Invertendo por simples descuido ou inaptidão a premissa antropocêntrica do filme, os efeitos visuais e a concepção dos ‘drones’ são os grandes chamarizes do mesmo, além da exuberante fotografia do extraordinário técnico Claudio Miranda. O uso de canções do Led Zeppelin (“Ramble On”) e do Procol Harum (a antológica “A Whiter Shade of Pale”) é assaz oportuno em momentos que visavam incentivar a paz de espírito que preenche Jack quando ele está em seu oásis terreno, numa casa de campo construída à beira de um lago e circundada por um bosque, onde ele se deu ao luxo adicional de erigir uma mini-biblioteca, onde se pode encontrar tanto o livro de poemas sobre baladas da antiga Roma (escrita por um autor chamado Thomas Macaulay) que ele cita antes de detonar a bomba que explode a sede espacial de seus contratadores malévolos quanto o providencial “Um Conto de Duas Cidades”, de Charles Dickens.

Excetuando-se estes elementos, pouco resta para ser elogiado em “Oblivion”, um filme tão entulhado de clichês e simplificações ficcionais que periga opor, enquanto efeito, justamente aquilo que é condenado em seu título: o esquecimento. Se o diretor não subestimasse tanto a inteligência e a moralidade de seu público, visando aos incrementos estatísticos na bilheteria, quiçá os resultados fílmicos fossem diferentes, podendo ser credível o discurso humanitário e ecológico implantado no roteiro de forma tão automática e sem inspiração...

 Wesley Pereira de Castro.

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