É inevitável: quando deparamo-nos com algum filme tailandês que sirva-se da Natureza como personagem extensivo ou pré-condição imersiva, a comparação com o mais famoso cineasta daquele país instaura-se. E, nesse caso, o saldo do cotejo é bem-sucedido, visto que a diretora consegue demonstrar-se autoral ao flanar por um terreno percorrido por vários de seus conterrâneos. Prefere o convite exposto no título da obra, ousa-nos falar de Myanmar, já que é para lá que os trilhos rumam...
Entretanto, ela não esconde para o espectador que o seu convite é atravessado por perigos: ao longo da projeção, ficamos em dúvida se os ruídos estrondosos que irrompem na noite provêm apenas dos fogos de artifício. A diretora evidencia que os mesmos foram gravados, quando as lâmpadas de um quarto piscam em reação ao barulho, mas também podem ser tiros, o indicativo de que a violência entrará em cena, a qualquer momento. E, de fato, ela ocorre, mas ludicamente: dois amigos fingem que são galos, e começam a brigar, repentinamente. Ao final, um zoológico deixa de funcionar, exatamente quando recebe a maior quantidade de visitantes...
Ainda que os elementos que concatenam aqueles personagens sejam parcamente desvendados, há pistas concretas no desenvolvimento do roteiro: logo no começo, a sapiência do quarteto de amigos em aderir a um passeio florestal, para driblar a frustração proveniente do museu interditado, é entremeada por misteriosos relances de uma mulher que arqueja à beira de um rio. Esta converter-se-á em homem, enquanto a tela divide-se em mais de uma situação, antecipando algumas repetições de diálogos. Sabemos que aqueles jovens são atores, e refletem sobre a importância do Teatro em seus futuros. É tudo um ensaio, na verdade? A vida não seria exatamente isso?
Fica a beleza do convite: a fotografia em preto-e-branco é magistral, o elenco juvenil é sobremaneira desenvolto e as canções que surgem na banda sonora são escolhidas com cuidado. A celebração do Ano Novo, mais uma vez, parece chamar a atenção para a complicada situação política birmanesa. A projeção na parede, subitamente, converte-se numa viagem de trem, que ocupa todo o quadro. O enigma permanece!
Wesley Pereira de Castro.
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