quinta-feira, 27 de janeiro de 2022

Mostra Tiradentes 2022: PANORAMA (2021, de Alexandre Wahrhaftig)


Demonstrando, mais uma vez, possuir excelente manejo das vinculações emocionais entre passado e futuro dos ambientes urbanos, este cineasta paulista erige poderosos alicerces em seu novo documentário, mas falha ao depositar paredes inconsistentes sobre eles, da mesma maneira que algumas moradoras comentam acerca das residências precárias com mais de dois andares construídas nas cercanias de onde vivem. Há poucas explicações diretas sobre como surgiu a região em pauta (o Jardim Panorama, na valorizada Zona Oeste da cidade de São Paulo), mas logo compreendemos que trata-se de uma favela gradualmente invadida pelas imposições condominiais do capitalismo especulativo... 


É interessante como a polissemia de algumas palavras é estrategicamente adotada no roteiro do filme: que o diga a imbricação de sentidos entre o título - que é também o nome da comunidade - e a abordagem panorâmica efetivada pelo realizador. O que sabemos sobre aquelas pessoas provém do que elas nos contam, através de diálogos permeados pela observação de fotografias antigas e pelos desenhos de plantas arquitetônicas rudimentares das moradias idealizadas. Quando verificam a abundância de andaimes ao redor, dois amigos comentam sobre o que será construído ali, com base nos rumores circundantes: "estas são as especulações"!


Malgrado a relevância dos discursos e a pungência dos testemunhos sobre reabilitação e resistência espacial e identitária ("dizem que não existimos, mas estamos aqui"), o documentário não é bem sucedido ao emular, via montagem, as noções comunitárias levadas a cabo pelos moradores entrevistados. Ficam os bons exemplos do homem que, na infância, via o seu avô medir diuturnamente o espaço em que residiam e dos versos tronchos porém sinceros da banda de 'hip-hop' Realidade Humana, cujos membros lutam para continuarem dignos, no que tange às condições de moradia, empregabilidade e recondicionamento social. O que o filme nos mostra é valioso, ainda que as seqüências funcionem muito mais isoladamente (vide a festinha de aniversário que acontece num determinado momento) que em sua concatenação enquanto longa-metragem. Afinal, favela é espaço de harmonia em meio ao desequilíbrio



Wesley Pereira de Castro. 
 

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