Dentre os cineastas expressionistas, F. W. Murnau [1888-1931] destacava-se pelo modo como conciliava os enredos lúgubres, característicos da situação do país à época, com a inventividade formal concernente ao movimento enquanto vanguarda artística. Sendo assim, ele atinge êxito ao transmutar a pujança anti-hipócrita da peça original de Molière através de soluções visuais bastante pertinentes, como sombras que deambulam através de espaços diversificados, graças à fotografia tipicamente contrastada de Karl Freund.
Numa determinada seqüência, uma mulher seduzida pergunta ao personagem-título: “é pecado o que estamos fazendo?”. Ao que ele responde: “quando se peca escondido, não se peca de fato”. Com isto, fica evidente o quanto ele beneficia-se dos engodos levados a cabo por falsos puritanos que anseiam por usurpar as fortunas (materiais ou não) das pessoas que se submetem à sua influência...
De acordo com o exegeta Siegfried Kracauer, o filme era também “tartufiano”, pois mantinha em estado de deleite “uma platéia ansiosa para manter intocado o que estava escondido”. Por isso, ele considerava desnecessária a estória-moldura contemporânea, em que vemos um velhinho ser explorado e lentamente envenenando por sua cobiçosa governanta. Porém, ela justifica o questionamento ousadamente direcionado ao espectador, num intertítulo: “tu sabes quem está ao teu lado?”.
Conforme demonstram filme e peça, os “tartufos” estão em todos os lugares, a maioria deles ocupando cargos políticos que autorizam que suas deformações ideológicas sejam perpetuadas ao longo dos tempos e tão aceitas quanto a limpeza equivocada que o velho interpretado por Hermann Picha cria encontrar em sua casa...
Wesley Pereira de Castro.
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