terça-feira, 20 de outubro de 2020

* Mostra SP 2020: PANQUIACO (2020, de Ana Elena Tijera)


 Visualmente, o filme é arrebatador. Mas esta característica traz consigo um problema diretamente relacionado: ele é "posado" demais, às vezes soa inautêntico, a despeito de sua fotografia irrepreensível. Em termos narrativos, por sua vez, este semidocumentário segue um percurso tão errático quanto o do personagem retratado, Cebaldo, um panamenho que vive há muitos anos em Portugal. Lá, ele trabalha num mercado de peixe e, por mais saudades que sinta de sua terra natal, torna-se cada vez mais aculturado. Tanto que, quando despe-se ao lado de um parente indígena, até mesmo sua pele parece esbranquiçada... 


Sobrepondo poemas e anedotas de quando os europeus conquistaram as Américas, de maneira violenta e invasiva, o roteiro do filme acompanha Cebaldo durante o seu retorno ao Panamá, a fim de enterrar alguém de sua família. Percorre os locais onde fôra criado e parece não mais reconhecer o que vê: estranha um pássaro que voa com um caranguejo no bico e carece banhar-se numa espécie de chá de ervas, a fim de retomar os seus vínculos espirituais. Neste sentido, o filme impressiona, compreende o deslocamento físico e anímico do personagem. Porém, estetiza demais, limita as epifanias concomitantes à realidade.


No Panamá, Cebaldo participa ativamente de uma festividade que celebra uma insurreição local: os moradores da cidade recriam as lutas com os invasores espanhóis e as mulheres cantam hinos. O olhar do protagonista é distante, como se tivesse esquecido o significado daquela cerimônia. Na tela, os versos que explicam o título do filme: Panquiaco foi um homem indígena que ensinou ao explorador espanhol Balboa o caminho para o Oceano Pacífico, em relação ao qual este proclamou-se descobridor. A Panquiaco, coube o sentimento involuntário de traição. Tudo isso aparece no filme, em alguma medida, mas o conjunto nem sempre é coeso. Beleza, por si mesma, não sustenta um bom filme! 


Wesley Pereira de Castro. 

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