sábado, 2 de outubro de 2010

O ÚLTIMO EXORCISMO ('The Lst Exorcism') EUA, 2010. Direção: Daniel Stamm

Para além de ser um filme bom ou ruim (e ele é quase unanimemente péssimo), “O Último Exorcismo” é um filme que escancara uma crise. Uma crise que, na verdade, é um somatório de várias crises globalizadas e manifesta-se no cinema enquanto estertor ideológico, tendo em “A Vila” (2004, de M. Night Shyamalan) o seu pólo positivo e neste filme mais recente o nadir decadente. Dizendo de outra forma: ambos os filmes abordam um tema similar, os questionamentos metalingüísticos acerca da necessidade que alguns indivíduos demonstram no que tange à retroalimentação de um medo sentido por algo que, oficialmente, não deve causar medo, por ser esquemático e artificial, mas, ainda assim, não somente causa como é também repassado a outrem. E, por desafiar até mesmo as convenções mais descaradas da irracionalidade, este medo estimulado com base em artifícios devidamente anunciados serve a interesses específicos de uma classe em voga ou de algum indivíduo em posição de poder, que assim visa manter a sua superioridade simbólica embasada no terror.

Se, em “A Vila”, a manutenção deste poderio simbólico estava atrelado aos anseios de uma comunidade de intelectuais traumatizados com o excesso de violência urbana que, como tal, forjam a existência de violentas entidades que circunvizinhavam o vilarejo propositalmente anacrônico em que residiam a fim de impedir que as gerações futuras desvendem a farsa utópica que engendrou a construção do reduto, em “O Último Exorcismo”, as intenções são bem menos nobres. São vergonhosamente oportunistas, aliás, tanto na forma quanto no conteúdo, o que torna imprescindível uma avaliação mais detida e, pelo caráter avassaladoramente formulaico do filme, paralelamente dispensável.


Tal qual acontecera em sucessos recentes de bilheteria como “A Bruxa de Blair” (1999, de Daniel Myrick & Eduardo Sánchez), “Mar Aberto” (2005, de Chris Kentis), “[REC]” (2007, de Jaume Balagueró & Paco Plaza) e “Atividade Paranormal” (2007, de Olen Peli), para ficar em apenas quatro exemplos conhecidos, “O Último Exorcismo” pretende extrair seu charme da simulação aterrorizante de que as imagens videográficas apresentadas enquanto filme seriam reais. Ao contrário dos quatro exemplos mais célebres, porém, “O Último Exorcismo” é uma lamentável coleção de equívocos. Para começar, a opção por ceder a “narração” do filme a um religioso que duvida de sua própria fé, transmitida para ele através de gerações, faz com que suspeitemos de imediato dos intentos anticlericais tendenciosos do roteiro, que, à medida que se aproxima do final, mostra-se mais e mais crédulo e subserviente aos ditames supersticiosos que fingiu combater no início, ao caracterizar o exorcista como sendo um homem espirituoso e com habilidades de prestidigitador, sendo que a evidenciação de alguns destes truques durante o processo de catarse psicológica das farsas exorcizantes revelam-se como alguns dos aspectos mais contraditórios e efetivamente falhos do filme. Contraditórios porque abrem espaço para o absoluto desbunde narrativo que se manifesta na meia-hora final, e efetivamente falhos porque, apesar de se mostrarem uma ótima idéia no momento em que o revoltado Caleb (Caleb Landry Jones) percebe que o reverendo Cotton Marcus (Patrick Fabian) pusera alguma substância que fez a água de uma bacia ferver quando entra em contato com os pés da suposta endemoniada Nell (Ashley Bell), chafurdam na inverossimilhança (leia-se traição) formal do próprio estilo supra-realista a que o filme pretendia se vincular. Afinal de contas, se o filme primava pela fidedignidade videográfica, para que a montagem esquemática entre causasefeitos e a execrável trilha sonora climática de Nathan Barr se dispuseram à sabotagem exibicionista constatada em cenas-chave desta obra ridiculamente desleixada? Para quê?!


Ainda que as atuações do elenco soem bastante firmes – com exceção da pusilânime Iris (Iris Bahr) – a equipe técnica de “O Último Exorcismo” recicla/plagia da pior forma possível os estratagemas já clicherosos deste tipo de produção, conforme se percebe em cenas simplesmente inverossímeis e vergonhosas como aquela em que Iris é freneticamente perseguida pela câmera quando corre no motel em que Nell repentinamente aparece ou toda a visualmente impressiva seqüência final (ponto para a fotografia de Zoltan Honti!), que imputa chavões ritualísticos/premonitórios de clássicos do cinema como “O Bebê de Rosemary” (1968, de Roman Polanski) ou “A Profecia” (1976, de Richard Donner). Além disso, a cena em que Iris doa suas botas vermelhas estilosas para a retraída Nell, a lascívia pretensamente demoníaca (e lésbica) que Nell demonstra quando surge no quarto de motel e a entrevista com “um rapaz obviamente ‘gay’”, acusado de engravidar a rapariga possuída, são mais alguns dos momentos desagradáveis e ideologicamente suspeitos deste filme ostensivamente partidário, que seja ao cúmulo de inserir o símbolo da anarquia entre os ícones satânicos que são pintados nas paredes da residência da família Sweetzer.


Em linhas gerais, portanto, “O Último Exorcismo”, francamente desinteressante enquanto cinema, revela-se (mas não necessariamente assume-se) como uma tentativa mentirosa e monetifágica de Hollywood em estrebuchar genericamente a fim de manter cativa e voluntariamente aliciada a fatia juvenil de seu público-alvo amplificado e desmemoriado no que diz respeito ao abarrotamento de fórmulas enredísticas entupidas de gritos e acordes musicais agudos, fatia de público esta que chega a se demonstrar incomodada quando é surpreendida por alguma reviravolta mais inventiva, contentando-se apenas com os sobressaltos somáticos dos sustos fáceis.

Exposta a consciência deste incômodo, fica aqui um dilema irresolvível: a culpa estaria somente nas mãos de técnicos politicamente medíocres como este tal de Daniel Stamm ou dos roteiristas Huck Botko & Andrew Gurland ou é impossível atribuir a culpa a alguém, dada a situação calamitosa do contexto aluído de produção e recepção pretensamente hipodérmica das ramificações incontroláveis do que conhecemos como Indústria Cultural? Eu que não me atrevo mais a aprisionar-me nesta falácia interrogativa de conformismo apocalíptico!

Wesley Pereira de Castro.

2 comentários:

Americo disse...

Destaque mesmo para a atuação da menina, que beira o cômico às vezes... a cena do sapato.. kkkkkkk


Gostei de ver também a reação da platéia, no fim mesmo, quando saíram todos decepcionados...kkkkkk

...

Depois me explique mais sobre a hipnotização nos filmes, prestei mais atenção nisso do que no filme todo!

lol
see ya!

Pseudokane3 disse...

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

É só tomar cuidado com a bola preta, Américo!

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