sexta-feira, 16 de outubro de 2020

* Mostra SP 2020: LUA VERMELHA (2019, de Lois Patiño)

 


Não obstante ser belíssimo, o filme requer entrega por parte do espectador: do mesmo modo que os personagens são afligidos por uma paralisia centenária (ou milenar?), a narrativa segue um percurso tão íngreme quanto as locações. O contexto que explica as razões do desparecimento do marinheiro Rubio é apresentado parcimoniosamente, através de indícios que, por sua vez, são inebriantemente captados, através da magistral direção de fotografia, efetivada pelo próprio realizador.


A despeito de sua juventude, Lois Patiño demonstra uma segurança invejável em relação aos temas fantasmagóricos que aborda, também compreendidos em sua metáfora ambientalista, contra o envenenamento progressivo engendrado pelas empresas que instalam-se à beira-mar. É conhecido dos festivais cinematográficos por causa de seu longa-metragem anterior, o documentário "Costa da Morte" (2013), sobre uma região da Galícia onde ocorrem freqüentes naufrágios. No filme mais recente, as bruxas surgem como força plácida de resistência, tal como as rochas que expõem-se ao perene assédio das ondas marítimas. Os cadáveres freqüentemente mencionados nos diálogos talvez sejamos nós, amortecidos pela peçonha sobressalente do Capitalismo…


O ritmo extremamente lento causa certo desconforto, o que é intencional. Associando-se estilisticamente aos filmes de Oliver Laxe e Sergio Caballero, o desfecho desta obra alcança a sobrenaturalidade fascinante prometida pelo título: em tons rubros, acompanhamos o retorno de Rubio aos locais onde sua falta é tão sentida. Sua mãe não cessou de esperar o seu reaparecimento, o que redunda em acusações de feitiçaria por parte de seus vizinhos. O sortilégio instaura-se de forma lacônica porém imageticamente expressiva. Requer entrega por parte do espectador, conforme dito acima, mas recompensa-o, ainda que tardiamente.



Wesley Pereira de Castro. 

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