sexta-feira, 12 de novembro de 2021

Netflix: 7 PRISIONEIROS (2021, de Alexandre Moratto)


Um dos aspectos que mais chamam a atenção por sua efetividade discursiva, neste filme, é o numeral contido em seu título, visto que ele possui um encargo intercambiante ao longo da trama: no início, acompanhamos a viagem de quatro adolescentes interioranos que se mudam para a capital de São Paulo, com a promessa de que serão bem remunerados por seus trabalhos; algum tempo depois, mais três imigrantes são adicionados a este grupo. Porém, ao invés de consolidar o hepteto anunciado, instaura-se uma avaliação sociológica muito mais delicada, em termos quantitativos: afinal, os prisioneiros são inumeráveis, numa progressão retroalimentada pelas necessidades urbanas e pela corrupção institucional. Quiçá até mesmo o espectador seja merecedor deste adjetivo, no sentido de que a complexa identificação sobrevivencial com o personagem de Christian Malheiros converte-nos também em prisioneiros, pois somos confundidos pela simpatia concessiva dos algozes, em meio às agressivas relações capitalistas... 


Numa interpretação mui delicada - possível graças ao ótimo entrosamento entre ator e diretor, decorrente de um longa-metragem anterior, "Sócrates" (2018) - Christian Malheiros faz com que direcionemos os mais diferentes sentimentos ao seu personagem Mateus: convertido, desde a sua primeira aparição, numa espécie de herói, pelo modo terno como trata as pessoas e por causa de sua inteligência, ele passa a ser gradualmente seduzido pelo poder a que tem acesso, como assistente do hediondo Luca (Rodrigo Santoro). Torna-se cada vez mais violento e moralmente corrompido, sem que assim se perceba, já que o enredo demonstra que ele apenas obedece a uma lógica hierárquica similar a qualquer outra organização contemporânea: ter privilégios implica em imputar sofrimento a outrem, mesmo que involuntariamente. O Capitalismo a tudo assimila, inclusive à benevolência! 


A tensão estabelecida entre Mateus e seus companheiros de cárcere é redimensionada: de conselheiro atuante, ele transforma-se num vigilante impiedoso, assemelhando-se cada vez mais ao antagonista patronal que ocupa a função paterna até então ausente em sua vida (exceto em seu desejo de ter quatro filhos). Confirmando o que fôra previsto pelo afrontoso Isaque (Lucas Oranmian), Mateus torna-se diretamente envolvido na agressão sofrida pela mãe do tímido Ezequiel (Vítor Julian). O ambiente e os personagens são mostrados cada vez mais sujos, e o desfecho é assaz pessimista, estabelecendo como um ciclo perenemente renovado aquilo que é orgulhosamente comentado por Luca: "essa cidade só está de pé por causa do que nós fazemos". Infelizmente, procede. Como podemos agir de maneira diferente, a fim de que não recaiamos no tormento consciencioso secundarizado pelo protagonista, cada vez mais hábil em seu enriquecimento material? Eis a pergunta que valoriza ainda mais o filme... 



Wesley Pereira de Castro. 
 

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