Por causa da predominância do cinema de Bombaim - conhecido internacionalmente como Bollywood -, eventualmente esquecemos que as largas dimensões nacionais da Índia engendram diferentes manifestações culturais, a depender da região: na parte setentrional, fronteiriça com o Tibete, encontramos Ladakh, onde foi filmado este filme. De tradição budista, este local, de caráter político-administrativo semiautônomo, serve aos interesses reflexivos do diretor estreante Maisam Ali, que narra as tentativas de reinserção familiar de um homem que volta para onde cresceu, depois de faltar ao funeral de seu irmão...
Interpretado por Harish Khanna, este homem está ausente há tanto tempo que não consegue sequer falar adequadamente o dialeto da região. Conversa, via Facebook, com um sobrinho que não conhecia, e vê-se diante de conflitos urbanos, entre jovens que brigam, depois que um deles tenta assaltar outro. Não é um enredo fácil de compreender, visto que as relações entre os personagens são balizadas pela mesma sensação de estranhamento e não pertencimento que atravessa o protagonista. Para piorar, quase todas as seqüências são filmadas à noite, de modo que percebemos muito mais do que efetivamente vemos as situações.
A despeito de seu extremo hermetismo, "Em Retiro" é um filme que justifica o título na própria maneira com que justapõe as cenas, visto que precisamos redimensionar a maneira como nos orientamos narrativamente, através das convenções tradicionais do gênero dramático: sabemos que uma jovem faz desenhos, no interior de sua residência, enquanto ouve uma canção da Billie Eilish ("When the Party's Over"); sabemos que o protagonista se delicia ao tomar uma sopa num estabelecimento local; sabemos que os adolescentes daquele contexto bebem e fumam, como acontece em qualquer outra parte do mundo. Porém, não identificamos adequadamente como os coadjuvantes se relacionam entre si, e em que sentido eles afetam emocionalmente o inominado protagonista. Ao final, a paisagem em movimento que se nota através da janela de um ônibus assume uma velocidade extremamente lenta, metonimizando a deambulação quase fantasmática do protagonista acerca dos lugares por onde passou, durante a breve visita à sua cidade-natal. Ele seguirá vagando depois disso, tanto quanto a nossa tentativa de entender aquilo a que assistimos... É um filme bonito, entretanto!
Wesley Pereira de Castro.
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