Avançando em sua proposta de finalizar uma trilogia documental sobre manipulação midiática - depois de realizar o interessante "A Fantástica Fábrica de Golpes" (2022, co-dirigido por Valnei Nunes - comentado aqui) -, o diretor baiano Victor Fraga, radicado em Londres, entrevista duas importantes personalidades britânicas, comumente criticadas por sua simpatia ao socialismo e pelas críticas ao imperialismo monárquico: o cineasta Ken Loach, duas vezes ganhador da Palma de Ouro no Festival Internacional de Cinema de Cannes, e o parlamentar Jeremy Corbyn, que foi líder do Partido Trabalhista entre 2015 e 2020. Segundo a narração, o próprio Ken Loach já teve a intenção de realizar algo protagonizado por Jeremy Corbyn, mas esta é a primeira vez em que eles são filmados juntos...
Na curta duração do filme (cerca de uma hora e setenta minutos), o documentarista senta-se diante de seus dois entrevistados, e eles conversam sobre o modo hostil com que são geralmente definidos nos meios de comunicação de massa locais. Algumas imagens de longas-metragens loachianos servem como ilustrações das falas de ambos, confirmando algo que o veterano realizador diz: "a divergência de opiniões é mais tolerada na ficção porque é ficção". Ao que Jeremy Corbyn complementa, elogiando-o bastante, referendando que o cineasta é assaz modesto ao falar sobre as suas necessárias provocações cinematográficas, sendo que algumas de suas obras foram censuradas internamente, já que "a mídia britânica é hostil a mudanças radicais no 'status quo'". Enquanto ouve, Victor Braga reage com expressões de estupefação e, obviamente, faz alguns comentários sobre a política brasileira, com destaque para o 'impeachment' sofrido por Dilma Rousseff e para a prisão injusta de Luiz Inácio Lula da Silva, sobremaneira conhecidos por Jeremy Corbyn. Mas o melhor momento de intervenção é quando ele pergunta a Ken Loach se "um cineasta socialista pode não ser realista?"!
Validando a entrevista, declarações encolerizadas de jornalistas vinculados à direita política são animadas através de pequenas vinhetas, nas quais ouvimos que "Leni Riefenstahl era mais sutil [em seu propagandismo] que Ken Loach" ou que seus filmes nem precisam ser vistos, "da mesma forma que não é necessário ler 'Minha Luta' para saber que Adolf Hitler é um monstro". O que confirma uma opinião progressista compartilhada por ambos os entrevistados: "o que seria de uma sociedade democrática em que não se tem acesso aos eventos, mas apenas a interpretações sobre os eventos?". Como tanto o cineasta quanto o parlamentar são eventualmente tachados de antissemitas, por serem favoráveis à causa palestina, Victor Fraga aproveita esta deixa para comentar a diferença de tratamento concedida à Rússia e a Israel. Em razão de a entrevista em pauta ter ocorrido antes do ataque da organização Hamas, em outubro de 2023, questões essenciais do debate são continuadas após a sessão, naquilo que ele incita. Vale acrescentar que o documentário, mesmo elementar em seus apanágios (o diretor tenta dinamizar o ritmo fílmico inserindo efeitos visuais durante os bastidores, como quando Jeremy Corbyn pede água ou quando Ken Loach recusa maquiagem), é deveras assertivo em seu discurso midiático-denuncista. Que venha a terceira parte da trilogia, com a participação do lingüista Noam Chomsky!
Wesley Pereira de Castro.
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